- Museu do Neo-Realismo
- O que é o Neorrealismo?
Movimento literário, surgido em Portugal, no terceiro decénio do séc. XX, que, inspirado na literatura norte-americana de preocupações sociais e no romance regionalista brasileiro, procurou instaurar uma literatura comprometida com os pincípios do realismo socialista, tematizando sobretudo as condições de vida dos camponeses.
(Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, Lisboa, Círculo de Leitores, 2003)O neo-realismo literário pode definir-se como um movimento que se desenrolou aproximadamente entre finais dos anos 30 e finais dos anos 50 deste século [XX], num contexto particular, correspondendo a parte do tempo histórico-político do salazarismo e sob o signo ideológico e cultural do marxismo.
(Biblos, Enciclopédia Verbo das Literaturas de Língua Portuguesa, Lisboa, Editorial Verbo, 1999)S.M. (de Neo + Realismo) - Movimento artístico, literário e filosófico que floresceu no pós-guerra, propondo uma revalorização do realismo tradicional e que, inspirado no materialismo dialéctico, procurava representar e dar voz aos anseios das camadas proletárias.
(Dicionário da Academia de Ciências de Lisboa, Lisboa, Editorial Verbo, 2001, vol. 2)
Quando esta geração, dos vinte anos, chegou à idade das primeiras leituras enchia toda a literatura europeia o subjectivismo, levado ao extremo em Proust, James Joyce, André Gide, Thomas mas, etc., e profundamente enraizado em Dostoïevski. Literatura intimista, por vezes psico-patológica, profundamente individualista, não correspondia, de modo algum, às necessidades positivas da juventude que nascia no post-guerra cheia de vitalidade, marcada com o desejo de viver plenamente a vida, sequiosa de claridade, de compreensão e comunhão humanas, buscando ansiosamente a verdade e a realidade.
(Joaquim Namorado, Do Neo-Realismo, Amando Fontes, in O Diabo, Lisboa, 1938)
Os neo-realistas afirmam que só a desmitificação da consciência pode conduzir a uma arte humana que, sendo arte, seja também humana, isto é, exprime os interesses e problemas dos homens que estão destinados a continuar a História.
(Rodrigo Soares, "Carta a um pintor sonre o Neo-Realismo", in O Diabo, Lisboa, 1939)
O Neo-Realismo não é uma escola, é o novo estudo da arte que corresponde ao advento de uma nova consciência, de uma nova cultura, de uma nova vida.
(António Ramos de Almeida, "Notas para o Neo-Realismo", in o Diabo, Lisboa, 1940)
Génese do movimento
Inspirado pelas teorias marxistas do materialismo histórico e dialéctico, divulgada nos meios políticos e intelectuais portugueses em meados dos anos 30, o movimento cultural do Neo-Realismo começa a desenhar-se a partir de importantes polémicas literárias então publicadas em periódicos como O Diabo, Sol Nascente e, alguns anos mais tarde, a revista Vértice, que afirmavam uma veemente oposição ao subjectivismo presencista, ao defenderem uma “arte útil” virada para os problemas reais da sociedade, fazendo assim a ruptura com o ideário romântico e positivista do século XIX. Na verdade, as condições político-sociais de uma década marcada não só pela crescente oposição entre fascismo e comunismo, como pelos ecos de sofrimento da Guerra Civil Espanhola e o início da II Guerra Mundial, exigiam a uma nova geração de escritores maior intervenção cívica e cultural, solidarizando-se desde logo com os desígnios progressistas da esquerda europeia, desde a Revolução Russa à Front Populaire, em França, ou à defesa da ética republicana, em Espanha.
Neste contexto, obras como Ilusão na Morte (novelas, 1938) de Afonso Ribeiro, Sinfonia da Guerra (poemas, 1939) de António Ramos de Almeida, ou logo depois Gaibéus (romance, 1939) de Alves Redol, Rosa dos Ventos (poemas, 1940) de Manuel da Fonseca, e Esteiros (1941) de Soeiro Pereira Gomes, vêm reforçar uma nova tendência na literatura portuguesa, traduzida desde cedo por um forte espírito engagée, isto é, politicamente empenhado na transformação das condições sociais do País, desenvolvendo temas como os conflitos de classe, a elevação moral dos oprimidos ou a esperança no futuro do Homem, identificando-se assim, de imediato, com o movimento de oposição ao regime salazarista do Estado Novo.
Prevalência do Conteúdo
Um dos grandes debates introduzidos pela estética neo-realista dizia respeito à dialéctica “forma” vs “conteúdo”, dando ênfase à mensagem simples e directa comunicada pela obra de arte (quer fosse literária, artística, ou outra). Abordada de modos distintos por alguns dos intelectuais então intervenientes, como Mário Dionísio (mais moderado, defensor de uma “osmose” entre “forma” e “conteúdo”) ou Rodrigo Soares e Álvaro Cunhal (defensores de um maior protagonismo conteudista no resultado criativo), esta questão manteve-se actuante ao longo dos anos 40, levando a tomadas de posição mais ou menos radicais que definiam o contexto crítico e intelectual do nosso País. Para isso, muito contribuiu o momento político do segundo pós-guerra, a memória do Holocausto e ainda a esperança de democratização do regime que significou esse momento de viragem no século XX.
Da ilusão do MUD e da candidatura democrática do General Norton de Matos à Presidência da República, em 1949, ao esfriamento das reivindicações progressistas, já nos no início dos anos 50, um clima de esperança invadiu a acção política oposicionista, arrastando a produção literária e cultural para uma dimensão mais empenhada e interventiva ao nível dos seus resultados sociais. Aos artistas foi então exigida uma espécie de prevalência do conteúdo, buscando assim uma maior consciencialização política e social dos receptores da obra de arte. No ímpeto congregador desse desígnio colectivo, escritores como Alves Redol, Soeiro P. Gomes, Manuel da Fonseca, Fernando Namora, Carlos de Oliveira, Joaquim Namorado, João José Cochofel, Mário Dionísio, Sidónio Muralha, Armindo Rodrigues, Faure da Rosa, Mário Braga, Antunes da Silva ou Vergílio Ferreira, e artistas plásticos como Júlio Pomar, Manuel Filipe, M. Ribeiro de Pavia, Lima de Freitas, Cipriano Dourado, Vespeira, Rogério Ribeiro, Querubim Lapa, Alice Jorge ou José Dias Coelho, procuraram com as suas obras traduzir uma mensagem de liberdade e solidariedade social, esperançados num despertar de consciências que conduzisse à transformação política de um país que caminhava para a mais longa ditadura europeia.
Este romance não pretende ficar na literatura como obra de arte. Quer ser, antes de tudo, um documentário humano fixado no Ribatejo. Depois disso, será o que os outros entenderem.
Alves Redol, Epígrafe à 1ª edição de Gaibéus, 1939
Para os filhos dos homens que nunca foram meninos, escrevi este livro.
Soeiro Pereira Gomes, Epígrafe-dedicatória da 1ª edição de Esteiros, 1941
Formas Novas podem conter um significado velho; da mesma maneira que formas velhas - ainda que excepcionalmente - podem conter um significado moderno e progressista.
Álvaro Cunhal, Acerca da Génese e da Universalidade de Arte Moderna, in O Diabo, 28 de Abril de 1939
Os valores estéticos são valores. São elementos sem os quais não existe arte. Simplesmente, pensa-se agora que os valores estéticos não existem em si próprios, que há qualquer coisa de mais vivo e mais profundo para que o artista deve viver.
Mário Dionísio, in O Diabo, Lisboa, 1945
Confusão da Arte com política? Nada disso. Numa sociedade em que, cada vez mais, tudo é político, apenas exigimos do artista que tenha cosnciência do papel político e social das suas obras, dos efeitos que não podem deixar de ter, qualquer que a seja a sua índole, sobre um público mais ou menso restrito, de uma ou de outra classe. Não queremos que, como artistas, façam política, mas sim Arte; apenas lhe pedimos Arte, não descarnada e abstracta, mas interesada e concreta, despida de preconceitos estéticos e integrada na vida e comunhão com os homens.
Armando Bacelar, A arte e o público, in Vértice, 44, Coimbra, 1947
Procura da Forma
Após um período marcado pela tendência conteudista, fundadora do movimento, as preocupações dos escritores neo-realistas centrar-se-iam, cada vez mais, num mais amplo investimento estilístico em torno da obra literária, coincidindo com uma fase de plena maturidade da sua primeira geração, daí resultando alguns dos títulos maiores, como Seara de Vento (1958) de Manuel da Fonseca, Barranco de Cegos (1961) de Alves Redol, ou a revisão de Uma Abelha na Chuva (1969) de Carlos de Oliveira, que deu origem à sua 4ª edição.
Por outro lado, assiste-se desde o final dos anos 40 e até princípios da década de 60 a um alargamento de interesses temáticos e perspectivas poéticas ou narrativas trazidos por uma vaga de escritores mais novos, como José Cardoso Pires (primeiro com Os Caminheiros e Outros Contos, de 1949, e anos depois com uma obra plena de maturidade estilística como O Hóspede de Job, de 1963), Ilse Losa (O Mundo em que Vivi, 1949), Orlando da Costa (A Estrada e a Voz, 1951), Júlio Graça (Buza, 1954), Urbano Tavares Rodrigues (Uma Pedrada no Charco, 1957) ou Augusto Abelaira (A Cidade das Flores, 1959).
Porém, apesar da diversificação e enriquecimento estético-formal então verificados, as preocupações político-sociais manter-se-iam, todavia, como matriz de uma produção cultural que não abandonara o seu propósito de consciencialização junto de uma comunidade de leitores que, mesmo perante a malha da censura e da perseguição política, não parara de aumentar, observando-se inclusive, nessa época, um acréscimo de popularidade e reconhecimento crítico entre os principais nomes do movimento neo-realista.
Forma vs Conteúdo: a polémica interna do neo-realismo
No início dos anos 50, a chamada “polémica interna do neo-realismo” traduziu-se por uma crescente clivagem em torno do problema da relação entre a forma e o conteúdo da obra de arte. De 1952 a 1954, as páginas da revista Vértice serviram de cenário a esse aceso debate intelectual.
De um lado, João José Cochofel, Mário Dionísio e Fernando Lopes-Graça defendiam o primado da linguagem formal de cada obra de arte, enquanto António José Saraiva, Manuel Campos Lima e António Vale (Álvaro Cunhal) opunham o conteúdo como agente primordial de intervenção social da arte.
Se os primeiros notavam que o valor do conteúdo podia identificar-se com a expressão maior da inovação formal, alimentando uma perspectiva heterodoxa que não abdicava ainda da função progressista da arte, os segundos mantinham uma linha de interpretação ortodoxa e contundente, ao manifestarem a necessidade da prevalência do conteúdo, em conformidade com a urgência de comunicação que a arte parecia ainda exigir.
Se o conteudismo ortodoxo, associado a uma tácita ingerência do PCP nos destinos do movimento, parece ter tido então a última palavra – com a direcção da Vértice a por fim ao conflito para impedir a “eternização” da polémica – a verdade é que os anos 50 marcam precisamente a mais espontânea e abrangente liberdade formal do neo-realismo literário, denunciando assim a derrota de qualquer orientação doutrinária mais estreita ou dogmática.
Herança do Neo-Realismo
Entre os novos romancistas e poetas que conscientemente assumiram, na fase inicial dos seus percursos literários, uma certa filiação no movimento do Neo-Realismo, Baptista-Bastos, (com O Secreto Adeus, 1963), Mário Ventura, (A Noite da Vergonha, 1963), ou na poesia, José Carlos de Vasconcelos, (Canções para a Primavera, 1960), José Carlos Ary dos Santos (A Liturgia do Sangue, poesia, 1963) e Manuel Alegre, (com o conjunto de poemas Praça da Canção, 1965) tornaram-se nos primeiros herdeiros intelectuais de uma expressão cultural que, apesar de viver já nessa época as condições da sua própria dissolução, marcara cerca de três décadas do século XX português, entre o final dos anos 30 e meados dos anos 60.
Refira-se que a herança de que aqui se fala não fora apenas literária ou criativa, mas igualmente, ou sobretudo, de cariz político, funcionando como motor de comunicação do movimento de oposição ao regime do Estado Novo, que por sua vez permanecia, aparentemente, sem fim à vista. Nessa medida, a estética neo-realista deixou um rasto de acção cívica e cultural que não deixaria de influenciar de um modo mais ou menos directo muita da criatividade portuguesa até ao final dos anos 70, coincidindo ainda não só com a euforia do pós-25 de Abril de 1974, como com o fim das ilusões de intervenção marxista no panorama político nacional.
Porém, o Neo-Realismo pode ser hoje observado, com distanciamento e objectividade, como um dos mais importantes movimentos culturais que o nosso País conheceu ao longo do século XX. Desenvolvendo-se num momento extraordinário de viragem político-social em termos internacionais, que vai dos anos 30 ao pós-guerra, redefinindo coordenadas de acção e pensamento, ao desenhar uma nova e intensa dicotomia entre o sistema capitalista e a hipótese comunista, o Neo-Realismo significou entre nós uma espécie de projecção artística das ambições políticas e sociais de uma parcela significativa da oposição portuguesa. Se outro valor não tivesse, o ímpeto de liberdade que subjaz a toda a criatividade neo-realista chegaria para fazer deste movimento um marco decisivo da nossa memória colectiva mais recente.
Artes Plásticas
Movimento essencialmente de expressão literária, o Neo-Realismo português teve nas artes plásticas um momento de eufórica utopia, como afirmação voluntária de uma nova geração que aí se ancorava no intuito de contribuir para a prometida mas nunca concretizada democratização do regime.
Com efeito, o movimento do Neo-Realismo significara para uma parte significativa dos jovens artistas da terceira geração modernista não só uma mais forte e arrojada opção estética face ao modernismo academizado da segunda geração, como uma rara oportunidade de reflexão humanista que alimentaria a esperança de uma verdadeira transformação progressista da sociedade portuguesa.
Os artistas plásticos que se destacaram no movimento neo-realista foram Júlio Pomar, Manuel Filipe, M. Ribeiro de Pavia, Lima de Freitas, Cipriano Dourado, Vespeira, Rogério Ribeiro, Querubim Lapa, Alice Jorge ou José Dias Coelho. Da divulgação teórica do suplemento “Arte”, publicado ao longo de 1945, à projecção uma prática artística pluridisciplinar nas “Exposições Gerais de Artes Plásticas” (1946-1956), o Neo-Realismo visual afirmou-se sobretudo na proporção das esperanças oposicionistas do imediato pós-guerra. Se com elas se projectou como espécie de vanguarda artística, logo se desvaneceu nas desilusões políticas que o final dessa década trouxera à soturnidade da vida portuguesa.
Cinema
Se aceitarmos, como Carlos Reis, que “o neo-realismo representa [...] a afirmação das teses defendidas, no plano cultural e literário, pelo marxismo e pelos seus divulgadores”, o que, consequentemente implicava “uma concepção materialista dos fenómenos sociais, a atenção conferida à dialéctica das transformações históricas, a valorização dos conflitos de classe como motor dessas transformações”, então pode dizer-se que o neo-realismo nunca existiu no cinema português.
E, no entanto, ao longo da década de 50, alguns filmes pareceram aproximar-se dessa corrente estética, cinematograficamente fundada na Itália e florescente no pós-guerra. O surto ocorreu mercê do abeiramento de alguns escritores neo-realistas ao cinema e do ar do tempo que, historicamente, ia acenando promessas de mudança.
Essa aproximação do cinema ao Neo-Realismo foi protagonizada por nomes como Manuel Guimarães e Leão Penedo, que acabaram também por influenciar o aparecimento do Cinema Novo Português.
Teatro
O reconhecimento das aproximações dos neo-realistas portugueses ao teatro, nas suas várias dimensões (dramatúrgica, cénica, ensaística), não poderá desligar-se do facto de que, pelos próprios constrangimentos políticos e censórios do período em que viveram e criaram, as suas obras – enquanto assumidas expressões de contracorrente, numa área artística muito vigiada pelo regime – dificilmente alcançariam uma ampla socialização e uma regular experimentação, pelo menos nos meios urbanos e nos circuitos oficiais. Esta evidência desvela, desde logo, os dois paradoxos em que o teatro neo-realista se viu enredado. Em primeiro lugar, o teatro - pela específica relação que estabelece com o público - constituía um veículo privilegiado para o acto comunicador (central em toda a intervenção dos neo-realistas), razão primeira por que foi especialmente silenciado pelo salazarismo, que, todavia, o utilizava eficazmente como instrumento apologético da sua acção e dos seus valores.
Em segundo lugar, as obras que perduraram foram as que conseguiram escapar ao lápis da Censura, precisando de obter, porém, os vistos das instâncias de validação coetâneas, isto é, da crítica e dos criadores teatrais. E é sabido que uma obra, neste caso uma peça de teatro, que está proibida de se materializar em cena, só muito excepcionalmente - como, de certo modo, aconteceu com Forja de Alves Redol - poderá tornar-se conhecida por aqueles que poderiam contribuir para a sua divulgação e, por conseguinte, pelo público.
Não deixa, pois, de ser curioso que, apesar de uma conjuntura tão hostil, seja possível sinalizar tantas e tão diferentes iniciativas dos neo-realistas, o que parece provar, em vários casos, um gosto intrínseco pelo teatro e uma persistente vontade de intervir por seu intermédio. Destacam-se como principais autores da dramaturgia neo-realista nas suas diferentes fases nomes como Luiz Francisco Rebello, Romeu Correia, Alves Redol, Pedro Serôdio ou Bernardo Santareno.
Música
A música tem ocupado um lugar marginal nos estudos sobre o Neo-Realismo português. Antes de mais por uma razão óbvia: a sua quase inexistência na órbita do movimento, se exceptuarmos, claro, a vasta produção de Fernando Lopes-Graça (na foto), única personalidade musical a ele associada de forma coerente. Mas mesmo o percurso do autor das Marchas, Danças e Canções não deixou de ser uma aventura solitária, num meio musical em que praticamente não encontrou interlocutores e em que a música erudita de intervenção política sempre foi um fenómeno raro e mal considerado.
Não existiu em Portugal, por isso, nada que se assemelhasse a um corpus musical colectivo, a uma corrente estilística, a um debate técnico e estético entre músicos progressistas, como os que existiram em diferentes momentos na União Soviética, na Alemanha ou em França. De tal forma que a figura de Fernando Lopes-Graça acabou por dominar, absorver e mesmo resolver por completo a questão, aparecendo invariavelmente como o compositor do neo-realismo português.
Censura
A censura e a repressão política estiveram desde cedo associadas à praxis do regime salazarista. Dos famosos “exames-prévios”, ainda hoje associados à memória do “lápis azul”, resultavam as autorizações ou proibições formais sobre a manifestação de ideias no nosso País.
Os cortes parciais, ou por vezes totais, de artigos, ensaios, romances, peças de teatro, ou a apreensão de obras de arte “subversivas”, faziam parte da ameaça criativa aos artistas e intelectuais portugueses, bastando para tal que o produto do seu trabalho implicasse, ou sugerisse apenas, qualquer espécie de sentido crítico em relação ao Estado Novo.
Dessa forma, “avaliados”, ficavam condenados ao obscurantismo ou, na melhor das hipóteses, à clandestinidade. A censura generalizada, muitas vezes até a auto-censura, caracterizava assim o regime e, por consequência, quase toda a sociedade portuguesa, tendo os intelectuais e artistas neo-realistas sofrido de perto o estigma de uma repressão diminuidora da liberdade do pensamento.