[N. Samouco, Alcochete, 1925 – M. Lisboa, 2002]
Tem 22 anos quando participa na I EGAP, com a obra que então denomina Fome e que lhe atribui destaque imediato e reconhecimento da crítica. Integra as I, II e X Gerais, nas quais apresenta, para além do trabalho já referido (e que volta a ser exposto na X com o título Apertado pela Fome), um estudo em cartão, um desenho a grafite e quatro estudos da série Rapazes e Raparigas da Cidade, que também constam do catálogo da II a X Exposições, com um total de 7 obras apresentadas às Secções de Pintura, Desenho, Aguarela e Guache.
Da sua infância conserva o rigor da geométrica interior das rendas da sua mãe e o fascínio pelas comunidades ciganas cujas músicas e danças inundavam, de quando a quando, a sua aldeia. A criatividade implícita nos seus “desenhos da imaginação” sustenta a aposta do seu pai na encomenda da decoração abstracta de A Diligente (1942), uma fragata que se afundaria no Tejo com três pescadores a bordo. Atravessa, em 1937, o mesmo rio, e matricula-se na Escola de Artes Decorativas António Arroio.
Ainda embrionário, aí germinava o grupo surrealista que se viria a constituir em 1947 e do qual viria a ser membro destacado. Reunido no Café Herminius, na Avenida Almirante Reis, o seu núcleo, constituído por Mário Cesariny, Fernando de Azevedo e João Moniz Pereira, entre outros, desmultiplicava-se em manifestações irreverentes de criatividade provocadora, baseadas no inesperado e no insólito, no palco que mais tarde se transforma numa agência funerária.
Matricula-se no curso de Arquitectura da ESBAL, o qual abandona por incompatibilidades com o seu director, Cunha Bruto, elemento da PIDE. Sem qualquer formação em pintura, começa a trabalhar em artes gráficas e publicidade, nos Estudos Técnicos de Publicidade.
Em 1943, juntamente com Júlio Pomar, constitui um atelier na Rua das Flores onde ambos organizaram a sua primeira exposição, que integra ainda obras de Pedro Oom, Gomes Pereira e Fernando de Azevedo, na qual os artistas forram, em sinal de protesto, as paredes da sala com folhas do Diário de Notícias, jornal conotado com o regime. Impressionado pela segunda Guerra Mundial, da qual vê todos os documentários exibidos na embaixada americana, começa por desenvolver obras de forte pendor social, motivado por uma nova consciência política. Nessa época, em que o café A Brasileira do Chiado se constituía como o centro das informações culturais, Vespeira encontra-se entre os jovens pintores neo-realistas. Colabora com Júlio Pomar no suplemento cultural do jornal portuense A Tarde, onde publica uma carta aberta aos pintores portugueses, onde critica a Escola de Paris e preconiza uma arte que servisse os homens. Apertado pela Fome, obra referencial deste período, conserva, para além do nome de um poema da resistência anti-nazi de Paul Éluard (Dressé par la Famine/L’enfant répond toujours, je mange/Viens-tu je mange/ dors-tu je mange), uma clara influência na obra Eco do Pranto de Alfaro Siqueiros, realizada quando o pintor mexicano lutava ao lado dos republicanos na Guerra Civil de Espanha.
Movido pelo desejo de descoberta da “totalidade do Homem” aproxima-se, logo em 1947, do Surrealismo quando funda, juntamente com António Pedro, António Dacosta, Mário Cesariny, Alexandre O’Neil, Fernando Azevedo, Moniz Pereira, António Domingues e José-Augusto França, o Grupo Surrealista de Lisboa cuja primeira exposição, em Janeiro de 1949, tem lugar no atelier de António Pedro e António Dacosta, na Travessa da Trindade. Esta exposição procura constituir-se como um manifesto contra o fascismo e de base de apoio à candidatura de Norton de Matos à Presidência da República. O núcleo de obras expostas está, a princípio, destinado a integrar a III Exposição Geral de Artes Plásticas da SNBA (1948), na qual o Grupo resolveu não participar em protesto contra a censura que ameaçava intervir na mesma. Do seu conjunto destacava-se um cadavre-exquis de grandes dimensões, jogo colectivo de resultado surpreendente pelo inesperado do contexto.
Na sua primeira exposição individual (1952), organizada em conjunto com Fernando Azevedo e Fernando Lemos, numa sala da Casa Jalco cedida pelo arquitecto Conceição Silva, Vespeira reúne mais de cinquenta trabalhos, entre óleos, guaches, desenhos, linóleos, colagens e esculturas. Estes reflectem uma aproximação a um imaginário de inclinação erótica, plasticamente traduzido numa série de obras automáticas que revelam o contraste e a tensão latente entre formas híbridas e pontiagudas. Já em 1959, as aus composições elásticas são arrastadas em telas de pintura complexa e formas animadas de desenho antropomórfico, materializadas em tonalidades avermelhadas verdadeiramente sensuais, a partir das quais cria um verdadeiro alfabeto gráfico pessoal.
É em 1954 que experimenta a via da abstracção geométrica, cujos trabalhos expõe no Salão de Arte Abstracta (Galeria de Março, dirigida por José-Augusto França) e cujas obras vem, mais tarde, a destruir.
Exposições individuais (selecção)
1952
– Casa Jalco
Exposições colectivas (selecção)
1943
– Exposição no Atelier da Rua das Flores, Lisboa
1949
– Exposição do Grupo Surrealista de Lisboa, Travessa da Trindade
1953
– 2ª Bienal de São Paulo
1954
– Salão de Arte Abstracta. Lisboa. Galeria de Março
1956
– Salão dos Artistas de Hoje. Lisboa, SNBA
- Mostra Internazionale de Bianco e Negro. Lugano
1957
– I Exposição de artes Plásticas da FCG. Lisboa, SNBA
- 4ª Bienal de São Paulo
1958-1959
– 50 Artistas Independentes. Lisboa, SNBA