- Museu do Neo-Realismo
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- O Desenho na Obra de José Dias Coelho
Curadoria: David Santos e Luísa Duarte Santos
"A obra de José Dias Coelho é ainda hoje pouco conhecida. A sua globalidade está na verdade por avaliar, pois as oportunidades de visibilidade têm sido escassas. As circunstâncias e as opções de vida do artista, nomeadamente a militância activa que resultou na sua morte às mãos da PIDE, também determinaram de um modo significativo a diminuta projecção de um trabalho artístico que poderia e deveria ter tido outra consequência e, por conseguinte, outro reconhecimento.
Esta exposição baseada essencialmente no produto do trabalho dessa disciplina, tantas vezes esquecida, o desenho, procura dar o seu contributo para uma clarificação sobre a riqueza estética e humanista do labor artístico de um autor que ficou sobretudo conhecido pelas suas esculturas, em particular, pelas várias “cabeças” que retrataram figuras políticas e culturais da oposição ao Estado Novo. A exposição baseou-se, no essencial, na inventariação e no estudo do espólio artístico doado em 1997 pela família de Dias Coelho.
Escultor, desenhador, pintor, viveu e morreu por uma causa que inviabilizou o desenvolvimento pleno da sua produção artística, afinal voluntária e conscientemente interrompida em nome de um imperativo político: a liberdade. Artista pouco referenciado, Dias Coelho é sobretudo lembrado pela envolvente dramática resultante da sua trágica morte às mãos da PIDE a 19 de Dezembro de 1961, o que, entre outras razões, tem condicionado um olhar mais distanciado sobre o valor intrínseco da sua obra, parte da qual pertence ao espólio doado a este museu.
José Dias Coelho nasceu a 19 de Junho de 1923, em Pinhel, cedo manifestando a sua preferência pelas artes plásticas. Em plena época de contestação ao regime, envolveu-se em inúmeras lutas não apenas em movimentos políticos, mas intervindo também em questões estéticas por uma maior abertura e visibilidade da arte moderna, quer na Escola Superior de Belas-Artes, como na Sociedade Nacional de Belas-Artes em Lisboa. Foi exactamente nas EGAP (de 1946 a 1956) que Dias Coelho apresentou alguns dos seus mais importantes trabalhos, tanto ao nível da escultura, como do desenho ou mesmo da cerâmica, período coincidente com o seu maior desenvolvimento e maturação artística.
A figura humana, em especial o retrato, atravessa com pluralidade estilística praticamente toda a sua obra; por isso, em termos estéticos, é difícil inscrever o seu trabalho num qualquer movimento artístico. A sua experimentação vai tocando diversas linhas, sem se deter em nenhuma em particular. Dos primeiros gestos de aprendizagem, marcados ainda pelo domínio técnico mais academizante, envereda por ensaios de simplificação geométrica, por abordagens eminentemente líricas, despojadas, sintéticas, essenciais numa reavaliação de valores gráficos mais próximos dos primeiros modernismos; outras linhas prendem-se com a descrição de um quotidiano ligado às suas próprias vivências, na captação do real observado; outras ainda demonstram o fervilhar de influências estrangeiras, sobretudo da Escola de Paris ou da herança figurativa do pós-guerra. Todavia, uma característica atravessa as suas obras, essa sensibilidade maior traduzida num enformar suave mas firme, de traços livremente delineados pelo desenho, na serenidade dos tons da sua pintura, ou ainda no barro ou gesso moldados.
Apesar dos limites impostos pelo trágico trajecto de vida do artista, a obra que nos legou é ainda assim suficiente para nela observarmos um valor determinante, capaz de o fazer figurar como um dos artistas mais significativos, e ainda por descobrir, no que à terceira geração modernista diz respeito."
Textos dos curadores
David Santos
Luisa Duarte Santos
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O encontro com Margarida Tengarrinha
decorreu no sábado, 5 de Abril, às 17h
no Auditório do MNR